ENTREVISTA
/ CLAUDIA MAURO, ATRIZ
Por Paulo Sales
Espetáculo: A Vida Passou Por Aqui
fotos: divulgaçaõ
08/02/2025
"A Vida Passou por Aqui", dirigida por Alice Borges e com Claudia Mauro e Édio Nunes no elenco, é um sucesso de público e crítica. A peça conquistou o Prêmio APTR de Melhor Texto e foi indicada ao Prêmio Bibi Ferreira 2024 de Dramaturgia Original. Claudia Mauro ainda recebeu indicações de Melhor Atriz nos Prêmios APTR e Cesgranrio.
A peça "A Vida Passou Por Aqui" é uma obra profundamente sensível e pessoal. Como foi o processo de transformar suas próprias vivências com sua mãe, após o AVC, em personagens tão universais como Silvia e Floriano? Houve algum momento específico em que você se deu conta de que essa história tinha o potencial de tocar tantas pessoas?
Claudia Mauro: A peça é um reflexo profundo de tudo o que vivi, uma fusão de histórias reais que marcaram minha vida. Cresci em um ambiente repleto de amor, festas e amigos, e foi nesse cenário que os personagens nasceram. O Floriano, por exemplo, é uma mistura dos homens que mais influenciaram minha vida: meu pai e meu avô. Já a Silvia é minha mãe, mas seu nome é uma homenagem à melhor amiga dela, minha madrinha de crisma. Quando minha mãe sofreu o AVC, encontrei uma agenda antiga em que ela mencionava as visitas de Floriano. Isso me levou a entender que a peça não seria apenas sobre a minha mãe, mas sobre a amizade, sobre a dor e a vulnerabilidade que todos nós carregamos, temas que, apesar de pessoais, são universais. Nunca imaginei que essa história chegaria tão longe, que tocaria tantas pessoas. Eu só queria fazer uma homenagem à minha família. No entanto, acho que o que faz a peça ressoar tão profundamente no público é sua simplicidade e verdade – ela fala de amizade, de alegria e das cicatrizes que todos carregamos, e é por isso que ela emociona tanto.
A direção de Alice Borges e a colaboração entre os atores são fundamentais para o impacto da peça. Como você e Édio Nunes construíram a química entre seus personagens? Houve improvisações ou ajustes durante os ensaios que surpreenderam a direção ou até a si mesma?
Claudia Mauro: Eu e o Ed temos uma grande química, porque somos amigos de longa data, e ele é um dos meus melhores amigos da vida. Durante os ensaios, foi muito natural a construção dessa relação entre os personagens. Nós dois estávamos vivendo situações pessoais de perda, o que ajudou a trazer uma verdade ainda maior para o espetáculo. Tinha improvisações durante os ensaios que refletiam nossas próprias experiências, e a Alice, como diretora, queria que tudo fosse simples e fiel ao texto. Ela não queria que a direção interferisse no naturalismo da história, então ela deixou que a química entre nós fluísse sem imposições.



Nunca imaginei que essa história chegaria tão longe, que tocaria tantas pessoas. Eu só queria fazer uma homenagem à minha família. No entanto, acho que o que faz a peça ressoar tão profundamente no público é sua simplicidade e verdade – ela fala de amizade, de alegria e das cicatrizes que todos carregamos, e é por isso que ela emociona tanto
Claudia Mauro



A utilização da dança, dentro da proposta realista e minimalista, é uma característica única da peça. Como você e Alice Borges trabalharam para incorporar esse elemento de forma que ele complementasse a narrativa sem perder a naturalidade? Qual a importância da dança na construção da relação entre os personagens Silvia e Floriano?
Claudia Mauro: A dança sempre fez parte da história porque minha mãe queria ser bailarina, e a dança, para mim, é uma forma de cura. A ideia de dançar estava presente no texto desde o início, com Floriano levando a Silvia para dançar. Alice, como diretora, queria que a dança fosse natural, pois a Silvia não é uma bailarina de fato, apenas sonhava ser. Eu e o Ed, sendo bailarinos, trouxemos nossa experiência para fazer a dança de forma autêntica, como eles dançando uma gafieira ou um rock. A dança representa um momento de alegria e cumplicidade entre os personagens, ajudando a curar e trazer à tona a vitalidade da Silvia, apesar das limitações físicas dela.
A peça traz à tona temas universais, como a amizade, o cuidado e a efemeridade da vida, sem cair no lugar-comum. Quais foram os desafios ao criar diálogos que fossem simples, mas ao mesmo tempo tão carregados de significado? Como você lidou com o equilíbrio entre emoção de ter vivenciado a história e sobriedade para manter a peça em cartaz durante 9 anos?
Claudia Mauro: Os diálogos surgiram naturalmente na minha cabeça. Eu escrevi a peça em um fluxo de duas madrugadas, e tudo veio de dentro de mim, das conversas com minha família, meus pais, meus avós. A emoção estava tão presente que o processo de criação foi bem orgânico. Eu nunca pensei em fazer a peça para ter sucesso, apenas queria contar uma história simples e verdadeira. O equilíbrio entre a emoção de reviver essas lembranças e a sobriedade de manter a peça em cartaz por tanto tempo veio da minha dedicação e do fato de que, para mim, essa história é tão autêntica que ela alcança o público de forma profunda. A peça está em cartaz há 9 anos porque ela é verdadeira e emocional, e isso ressoa com as pessoas.